domingo, 25 de abril de 2010

Dona Cidália não era prostituta. Estava prostituta.

A igreja publicava, todo domingo, um boletim impresso. Era meu costume, às quintas-feiras, deixar na tipografia os originais. Nas sextas, revisava tudo e, com essa rotina, passei a conhecer todos os funcionários da gráfica, entre os quais dona Cidália (nome fictício). Sempre cordial, ela me saudava quando me via. Era-lhe tarefa juntar folhas e dobrá-las.

Uma noite, após umas visitas no Hospital Evangélico, voltava à casa pastoral quando parei meu “pé-de-boi”, um Volkswagen “pelado” que estava pagando em 36 meses à Caixa Econômica, num semáforo, e tive grande surpresa. Naquela esquina, usando peruca, minissaia e blusa decotada, lá estava ninguém menos que dona Cidália. Senti que ficou chocada ao me ver.

Segui o rotineiro procedimento das quintas e sextas, sem jamais modificar minha atitude para com essa mulher, continuando a cumprimentá-la com a mesma cordialidade de sempre, como se jamais tivesse visto a cena da esquina. Tempos depois, no Hospital do Cajuru, a perna esquerda engessada após terrível acidente que depois mencionarei, recebi, entre as inúmeras visitas, uma muito especial. Certa tarde, dona Cidália veio me ver. A sós comigo, abriu seu coração. “Estou aqui por três motivos. Primeiro, vim ver como o senhor está. Vim também para lhe agradecer. O senhor nunca referiu a ninguém o que viu nem mudou seu modo de me tratar. E, em terceiro lugar, quero lhe  dizer que não tenho essa atividade como profissão. Vou à rua porque meu marido é bêbado e tenho três crianças. O salário da gráfica mal paga o nosso aluguel e fico desesperada de ver os meninos sem ter o que comer.”

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